É razoável pensar que quando falamos de eficiência e funcionalidade em relação a um produto que adquirimos, falamos também em sua durabilidade. Muitos pesquisadores e técnicos se debruçaram sobre suas pranchetas e mesas diante deste desafio: como produzir algo que apresente longevidade e confiança em relação ao seu uso.
Mas, e se de repente esta lógica fosse invertida no sentido destes profissionais serem orientados a desenvolverem estes mesmos produtos de modo a que durassem menos? Ou melhor, de modo a que perdessem sua funcionalidade num tempo não só mais curto mas intencionalmente programado?
Pois é o que nos apresenta o documentário A CONSPIRAÇÃO DA LÂMPADA (no original: The Light Bulb Conspiracy), de 2010, dirigido pela alemã Cosima Dannoritzer.
Obsolescência Programada
Esta roda, a que denominamos capitalismo, tem como seu eixo central a produção e consumo de bens e de serviços.
Temos como exemplo (entre outros), no documentário em questão, uma lâmpada de filamento, destas que até pouco tempo eram comumente usadas em nossas casas e aos poucos vêm sendo substituídas pelas de Led.
A princípio, quando foram criadas, apresentavam como grande atrativo justamente sua longevidade. Mas aí surge um problema relacionado ao girar da roda: se eu fabrico algo que dura muito, logo não terei mais a quem vender este produto, o consumo cessa ou, ao menos, diminui.
Pois bem, no Natal de 1920, preocupados com este problema, um grupo de empresários fabricantes de lâmpadas de todas as partes do Globo (entre eles as conhecidas G&E, Osram e Philips) chegaram a “brilhante” conclusão de que, para manter seus lucros, deveriam reduzir intencionalmente a vida útil de suas lâmpadas, gerando desse modo uma demanda maior por seus produtos.
Inauguravam, assim, duas práticas bastante utilizadas e eticamente questionáveis: Os Cartéis (grupos unidos para defender interesses específicos, neste caso, interesses econômicos) e o que acabou por ser conhecido como Obsolescência Programada (OP) ou planejada.
O cartel, denominado e devidamente registrado como Phoebus (brilhante, luminoso na mitologia romana) S.A. ao perceber que suas lâmpadas duravam “muito”, resultado como já dito, de extensas pesquisas, decidiram reduzir a vida útil de seus produtos para menos da metade de sua capacidade original!
Chegaram inclusive, como nos é mostrado durante o documentário, a fiscalizar e multar aqueles fabricantes pertencentes ao grupo, que por algum motivo não reduzissem a qualidade de suas lâmpadas. Quer dizer, os que não adotassem a redução programada da utilidade de seus produtos, a tal obsolescência programada.
A roda não pode parar!
É toda uma engrenagem girando ao contrário para sustentar algo absurdo do ponto de vista lógico e funcional (mas bem inteligente, do ponto de vista de seus interesses), engenheiros dedicando seu conhecimento a desenvolver algo cuja funcionalidade se encurte com o tempo, algo totalmente disfuncional, pra não dizer inescrupuloso.
Emblemática a cena onde um professor, com a justificativa de que, caso contrário, haveria uma espécie de colapso do sistema, orienta seus alunos, futuros engenheiros e designers – numa disciplina especialmente voltada a esta prática – sobre a importância de dominarem este conhecimento.
Os exemplos prosseguem: carros, impressoras caseiras com chips especialmente criados para travar, meias femininas de nylon, baterias de ipod…
Claro, o problema não é o consumo em si, algo inevitável, mas a situação onde o girar da roda dependa de um consumo desnecessário, criado artificialmente e ditado pela O.P. Se isto se apresenta como base para funcionamento de uma sociedade, deveríamos, no mínimo, questionar que tipo de sociedade é esta.
Quase todo mundo perde.
Um dos aspectos mais importantes e subjacentes do documentário é mostrar uma das diversas contradições relacionadas ao sistema em que vivemos, e que nos ajuda a entender os motivos de nos encontrarmos em situações sociais, ambientais, econômicas tão injustas para a maioria da humanidade.
Sim, porque o aumento desnecessário da produção causado por tal prática, obviamente implica em aumento não só do descarte de produtos no meio ambiente, mas também da utilização de matérias-primas necessárias à criação dos mesmos.
O único movimento considerado necessário aqui, é o que chamamos comumente de “Lucro”. Porque, ao menos em tese, os avanços tecnológicos diminuindo os custos de produção, aumentariam a possibilidade do trabalhador passar a ter mais tempo para, de fato, viver e, ao consumidor, produtos mais confiáveis e baratos.
Enfim, o consumo desnecessário é estimulado, o meio ambiente abarrotado de lixo (que como nos é mostrado, nunca é jogado no quintal de quem o produz), recursos naturais tão fundamentais como água, minérios e árvores são desnecessariamente utilizados. No final das contas “quase” todo mundo perde.
Se situarmos o auge deste tipo de comportamento nos anos do pós-Segunda Guerra, hoje, apenas 70 anos, depois já percebemos a série de becos sem saída em que ele nos colocou. A pergunta que fica é: onde estaremos daqui a 70 anos caso não façamos uma drástica revisão disto tudo? Creio que este documentário soma bastante a esta reflexão.
A CONSPIRAÇÃO DA LÂMPADA
Título Original: The Light Bulb Conspiracy – 2010 – Espanha/França
Direção: Cosima Dannoritzer
Duração: 75 minutos
Legendas em português
Assista a versão integral aqui