Acredito que poucas pessoas, ao serem questionadas sobre quais seriam seus principais desejos ou sonhos, não incluiriam em suas respostas a “felicidade”. Resposta um tanto genérica, se começarmos a pensar sobre o assunto de modo um pouco mais detido.
Embora o termo (felicidade) seja bastante abstrato, passamos grande parte de nosso tempo, concretamente, pensando ou agindo na busca de sua realização. Mas, muitas vezes, o que resta após alguma conquista (profissional, afetiva, etc.) que parecia traduzir este objeto de desejo tão procurado, é passarmos novamente a correr atrás de uma nova forma de sua concretização. Como se estivéssemos enganados em relação ao que era nosso alvo.
Não quer dizer que não se deva buscar condições melhores para nossas vidas ou desejar e agir para que isto ou aquilo nos aconteça. Mas, já foi dito que nossos desejos ocupam sempre lugares vazios.
Podemos pensar isto da seguinte forma: somos seres desejantes, para além de nossas necessidades básicas de sobrevivência, estamos em grande parte de nosso tempo, projetando e tentando viabilizar coisas movidos por isto. Sob um certo ponto de vista psicanalítico, podemos nos ver como seres “de falta”, talvez, até destinados mesmo a incompletude existencial.
Deste modo, seríamos, a rigor, movidos por nossos desejos que, assim que satisfeitos, se transformariam em outros. Então, afirmar que o desejo ocupa um lugar vazio quer dizer que ele se mudará para outro espaço interno, assim que satisfeito e que este movimento, de certo modo, é o que nos leva adiante. Uma certa insatisfação inerente, com a qual deveríamos aprender a viver.
É uma tese interessante, creio. E, à exceção, talvez, de alguns seres iluminados, de fato, parece traduzir bem a condição humana. O desejo como algo em si mesmo – sem necessitar de um objeto definido ou definido apenas temporariamente –, como motor pra prosseguirmos.
Ocorre que esta busca, falando de modo bem genérico, acaba por ser causadora do que seria o inverso de seu objetivo, isto é, a busca pelo preenchimento deste espaço pode ser, justamente, a causa de muita infelicidade.
Em partes, provavelmente devido a esta ser uma busca que realizamos de modo indireto, isto é, a busca por felicidade se manifesta, invariavelmente, por meio da busca por coisas ou situações que a concretizem. Imaginamos algo que nos trará felicidade e passamos a tentar obter este algo na crença de que a felicidade ali se encontra.
O problema não é novo. Parte importante do pensamento clássico já se debruçava sobre ele e a própria Filosofia já foi conhecida como a “arte do bem viver”. Em um período em que o pensamento humano muda um pouco seu foco, da busca por entender o universo como um todo e passa a se voltar mais para questões antropológicas, isto é, ter o homem e a vida humana como centro de suas reflexões.
Em última instância, este bem viver, se tratava também da busca pela felicidade. Contudo, para alguns, a definição deste termo era o centro da questão.
Isto porque, se a definirmos como uma busca por algo específico, externo a nós mesmos, correremos o risco de ao alcançarmos este fim, devido a nossa própria caminhada, termos nos transformado ao ponto de não mais reconhecermos aquilo como resposta adequada.
O imóvel tão desejado e conquistado nos mostra ter seus problemas cotidianos, despesas, etc. Para conquistá-lo sacrificamos tantas outras coisas, para agora, chegarmos a conclusão de que o que precisamos é um outro imóvel, na praia, por exemplo. Ou um imóvel maior, menor, mais bem localizado, e assim por diante.
A história do pensamento nos mostra que a questão – “o que, de fato, vem a ser felicidade?” (e, seu desdobramento natural, “afinal, como encontrá-la?”) – já foi respondida de diversas formas. Prazer total e desregrado dos sentidos (hedonismo), abstenção total deste tipo de prazer (ascetismo).
De modo geral e como em outras questões as respostas parecem se encontrar, quando guiadas pelo bom senso, no que foi chamado de mediania (Aristóteles) ou a justa medida. A moderação aplicada nas práticas cotidianas até as decisões mais importantes de nossas vidas.
A razão seria uma espécie de guia e, ao mesmo tempo, moderador de nossas paixões, aqui entendida em seu sentido amplo, nos direcionando escolhas que, seja a curto ou longo prazo, nos cause prejuízos de diversos tipos.
Parece óbvio e até bastante simplório. Talvez seja esta mesmo a intenção: reduzir conceitualmente os problemas até conseguir condensá-los em fórmulas mais básicas e práticas > ensinamentos > sabedoria.
Mas, é fundamental lembrarmos que sem o trabalho da prática, o trabalho do entendimento pode ser estéril ou mesmo empecilho no caminho de mudanças importantes. Agir, guiados por um bom pensamento requer uma certa disciplina, principalmente em momentos extremos, sejam extremamente bons ou ruins.
No primeiro caso, porque em momentos onde entendemos que tudo está bem, tendemos a esquecer ou mesmo evitar o pensamento sobre as inevitáveis mudanças próprias dos movimentos da vida, no segundo, porque diante de momentos de dificuldade, sequer conseguimos formular claramente algum tipo de pensamento que nos ajude a mudar ou mesmo entender a inevitabilidade daquela situação que nos incomoda.
Um desafio e tanto.
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