Relógios e outros aparatos, apenas estabelecem uma relação entre diferenças que se apresentam (com luz, sem luz, de manhã, à noite) medir e comparar estas diferenças de modo numérico é criação nossa. Quer dizer: as coisas se transformam, mudam, algo é, depois deixa de ser, vira outro tipo de coisa, ao mesmo tempo em que outras coisas parecem permanecer, as mudanças ocorrem, muitas vezes independente de nossa vontade ou presença, porém, medi-las, é coisa nossa, humana.
Isto não explica muita coisa, na verdade, complica um pouco algo que parece naturalizado para todos. No entanto, o exercício de ensaiar reflexões sobre este ou outros fenômenos parece ser imprescindível, já que o Tempo costuma estar sempre envolvido nas queixas em relação às nossas vivências atuais.
Agostinho (de Hipona – 354-430, no Livro XI de sua obra Confissões) foi um dos que especulou sobre esta questão que não se entrega facilmente à explicação. Grosso modo, Agostinho nos diz que o passado não existe mais (a não ser como uma impressão na alma, a memória), o futuro ainda não chegou e o presente torna-se pretérito a cada instante.
“Que é, pois, o tempo? Quem poderá explicá-lo clara e brevemente? Quem o poderá apreender, mesmo só com o pensamento, para depois nos traduzir por palavras o seu conceito? E que assunto mais familiar e mais batido nas nossas conversas do que o tempo? Quando dele falamos, compreendemos o que dizemos. Compreendemos também o que nos dizem quando dele nos falam. O que é, por conseguinte, o tempo?…
E conclui, ainda que temporariamente.
“Se ninguém me perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei”
Problema: o passado é algo que já não é mais e se afasta paulatinamente, deixando rastros e indícios em nossa consciência, o futuro ainda não é, não tem existência concreta – embora nos forneça em alguns casos algumas certezas de concretização – quando chega, na verdade nem é mais futuro, pois vira presente.
O presente, bom, ao escrever esta frase, seu presente já virou passado, o que significaria que o que, de fato existe é apenas o presente ou seja, voltando ao começo, como medir algo que sequer conseguimos definir como existente?
Impossível aqui ir além de lançar questionamentos, emitir opiniões, encontrar algumas pistas. Creio que é o caso também do documentário Quanto tempo o tempo tem (2015).
Depoimentos e reflexões acerca do Tempo, sua existência e implicações na fala de profissionais e pensadores de diversas áreas do conhecimento (sociólogo italiano Domenico De Masi, a escritora Nélida Piñon, o filósofo André Comte-Sponville, entre tantos outros tentar dar conta desta complexa questão.
Dirigido por Adriana L. Dutra, o documentário realizado em 2015 tem a duração de 76min e está disponível em streaming.
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